Serra do Corvo Branco

Serra do Corvo Branco
Serra do Corvo Branco

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Segundo conto , ou causo?

RELICÁRIO
Sim, este é o nome de nosso parceiro ciclista. Jovem, esbelto, muito preocupado com sua apresentação pessoal procura combinar a cor da bermuda com a da camisa, da meia, e até do óculos. Para cada ocasião, um óculos especial. Pois justamente por causa desta mania de combinar coisas é que ele quase entrou numa fria. Estávamos em uma cidadezinha de origem alemã num destes passeios de cicloturismo que fazemos durante o ano. Prá não aguçar os curiosos, bem longe daqui. O dia havia sido puxado, 75km de bike subindo e descendo morros não é para qualquer um, mas para Relicário isto não era problema. O problema era que para o dia seguinte ele havia separado um conjunto de roupas com um tom de azul que deveria combinar até com a cor da bandana e com a borda da cueca, caso esta aparecesse, mas o problema, como dizia, era que não havia trazido seu óculos azul... Como Relicário pedala muito bem (com frequência comenta de suas façanhas no exterior, mas isto é outra história...) ele havia chegado da pedalada ao hotel mais cedo, tomou rapidamente um banho (mas não esqueceu de passar seu creminho hidratante, um perfume e de dar um retoque no penteado....) e foi até o shopping local – a bem da verdade, um camelódromo - atrás de um óculos para a combinação do dia seguinte. Não foi preciso muito esforço, logo em seguida encontrou uma armação perfeita, inclusive as lentes eram azuis, e, por incrível que pareça, era até mais bonito do que o óculos que ficara em casa. De volta ao hotel, após a caipirinha com os demais grupos de ciclistas no saguão, troca de emails, telefones, e conversas etilicamente efusivas, saiu com a turma para jantar. Como queria acostumar-se ao óculos, Relicário nem os dispensou, foi logo fazendo seu “olhar 43” pras gurias que encontrava pela frente. O fato, é que depois de tanta caipirinha, Relicário já não estava enxergando muito bem, e pior: como o óculos fora comprado de última hora não estava com as lentes de sua receita, e por isto, astigmatismo, miopia e até um pouco do seu estrabismo estavam acentuados. Pois bem, depois de um delicioso joelho de porco com chucrute (eisben: se pedir assim, a mulherada come, acha delicioso e nem ficam sabendo o que era a iguaria) típico da região e de algumas canecas de chopp, Relicário não distinguia mais o que era Fritz ou Frida... não deu outra. Tinha um “TravesFritz” sentado num canto, sozinho, e que não tirava os olhos de Relicário. Já dissemos, nosso amigo é um ciclista bem apessoado. Ocorre que percebendo-se observado, e, depois de tudo o que bebera e da deficiência visual decorrente do óculos de ocasião, deu no que deu. Relicário levantou-se e sem que a “moçoila” sentada dissesse uma palavra (talvez ainda como última esperança nosso amigo pudesse distinguir o tom grave da sua voz...) lançou-se a dançar com ela ao som da Bandinha que animava a festa. Bar que se preza em terra de alemão tem que ter música ao vivo. ... Bem, para encurtar o relato, Relicário já estava cansando de tanto dançar, muito embora estivesse animado, e como estava animado! Some-se a isto os quilômetros de pedal feitos naquele dia e ainda os que teria a mais no dia seguinte... A esta altura o corpo já falava: cansaço, visão turva e ainda com a bexiga que já não aguentava mais de tanto chopp. Então Relicário disse para Adelaide - este era o nome - que precisava parar pois iria ao banheiro. A mesma, nem acreditando que estava dançando abraçada com aquele “Deus Grego”, não querendo perdê-lo, disse que não teria problema, que o acompanharia assim mesmo até o banheiro. Relicário sorriu, e foi logo até o mictório. Faceiro com a situação, nem se dava conta do que acontecia... Aliás, sim, aconteceu! Como um tombo de bike morro abaixo em que se quebram os dentes da frente contra o barranco, entendeu que algo não estava certo quando, ao seu lado, Adelaide, EM PÉ, utilizava-se também da mesma calha do mictório.... E, no chacoalhar de “seu penduricalho” – entenda-se: o dela - caiu-lhe a ficha! A Frida era mesmo um Fritz!!! Bem, Relicário saiu enfezado do mictório, foi direto para o hotel, e no outro dia ninguém o viu no café da manhã. Havia saído mais cedo e estava léguas à frente dos demais ciclistas. Há quem diga que Relicário ao voltar para casa desfez-se de todos os óculos coloridos e passou a utilizar unicamente aquele que tinha a prescrição para seu caso. Vez ou outra continua a pedalar com o grupo e a tomar um chopp, mas que ninguém o convide para ir a alguma Oktoberfest.
( © copyright by Kokopelli – transcrito com autorização)

2 comentários:

  1. Muito bom, muito bom! O "relicário" se parece com alguns ciclistas que conhecemos ao longo dos Audax. Todos combinando tudo com tudo e se achando uns baita "galos". Valeu, essas história são ótimas!

    ResponderExcluir

nome
email